Argentina: extrema direita vence as eleições presidenciais. Tarefas e lições para a esquerda

Translated from english to Portugese and published by Movimento Alternativa Socialista

No domingo, 19 de novembro de 2023, a Argentina viveu a segunda volta das eleições presidenciais. Os concorrentes eram o ministro da Economia, Sergio Massa – no meio de uma das maiores crises económicas da segunda maior economia da América do Sul (inflação acima de 140% e 40% da população na pobreza) – e o “libertário” de extrema-direita e outsider Javier Milei.

O resultado final foi a vitória de Milei, com uma margem maior do que o previsto pelas sondagens (56% contra 44% de Massa) e vencendo na maior parte das regiões do país.

Tal resultado reanimou a extrema direita na América Latina e pode, potencialmente, desdobrar-se em impactos regionais e globais. Políticos de extrema direita, como Donald Trump e o ex-presidente brasileiro Bolsonaro (e até Elon Musk), comemoraram imediatamente a vitória de Milei nas redes sociais.

Do outro lado, políticos de esquerda e centro-esquerda, como o presidente colombiano Gustavo Petro e o brasileiro Lula, reagiram com sentimento oposto.

Na verdade, a vitória de Milei – numa nação importante como a Argentina – não segue a tendência anterior de vitórias eleitorais de esquerda/centro-esquerda na região. E isso, com um possível regresso de Trump à Casa Branca (ou qualquer outra variação de extrema-direita), poderá mudar o panorama geopolítico na região.

As políticas ultraliberais e reacionárias de Milei

A agenda de Milei é consideravelmente de direita, em todas as áreas.

Ele é um negacionista da emergência climática, defende a ditadura militar que governou violentamente o país nas décadas de 1970/80 e minimiza os crimes por esta cometidos. Milei é contra o direito ao aborto (uma conquista recente do movimento feminista na Argentina) e afirma que trabalhará contra as relações com países “comunistas” como China e Brasil – os maiores parceiros comerciais do país, além de defender a saída da Argentina do Mercosul (bloco regional de livre comércio). Além disso, Milei apoia o genocídio de Israel na Palestina – chegou até a agitar uma bandeira israelita nos últimos dias da sua campanha.

Em termos económicos, Milei segue a agenda ultraliberal “libertária de direita”. Promete privatizar “tudo”, começando pela gigante petrolífera YPF (que detém actualmente 51% do controlo estatal, depois de ter sido privatizada na década de 1990). Milei promete fechar o banco central da Argentina e dolarizar a economia. Certamente, Milei atacará a classe trabalhadora argentina, ainda mais agressivamente do que o atual governo neoliberal, responsável pela profunda crise em que o país se encontra hoje.

No entanto, ainda não está claro se Milei conseguirá implementar a sua agenda “libertária”. As políticas económicas que defende provavelmente prejudicariam ainda mais a economia argentina no curto prazo –como sabemos pelas experiências anteriores de dolarização noutros países. Além disso, cortar relações com os seus principais parceiros comerciais não é uma medida muito astuta, especialmente para um país que precisa desesperadamente de reservas.

Não obstante, o partido de Milei tem 32 assentos na câmara baixa argentina (menos de 15% da Câmara) e um pouco mais de 10% do Senado.

A resistência da classe trabalhadora: derrotar Milei e apresentar uma agenda alternativa dos trabalhadores

Mas esse não será o único problema de Milei. A classe trabalhadora argentina tem uma forte tradição de combatividade, apesar da poderosa influência Peronista. A situação social e económica do país é terrível –e será agravada com as políticas do Milei. Além disso, movimentos sociais muito poderosos, como as marchas das mulheres que alcançaram vitórias no direito ao aborto, não ficarão calados sob os ataques do Milei.

Existe a possibilidade real de uma resposta forte da classe trabalhadora, com greves e agitação social. Esse deve ser o estado de espírito e a resposta da esquerda argentina e latino-americana. Intervir, incentivar, construir esses movimentos sociais como resposta à Milei.

E, obviamente, não para defender o governo anterior – que colocou o país naquela situação e abriu as portas à extrema-direita – mas para defender uma resposta anticapitalista à crise. Não tristeza, desespero ou medo – mas luta social. Essa é a maneira de enfrentar e derrotar a extrema direita, os fascistas e de mais variações.

Unidade para derrotar a Milei

A Argentina tem uma longa tradição de organizações socialistas. Nestas eleições, concorreram separadamente nas primárias, mas, correctamente, apresentaram uma alternativa unificada (FIT-U) na primeira volta – alcançando quase 3% dos votos numa eleição muito polarizada.

É um número pequeno se comparado ao que é necessário para vencer as eleições ou chegar a uma segunda volta – mas muito importante para estabelecer um pólo alternativo, independente do Peronismo, para as disputas do próximo período.

Agora é hora de manter a esquerda numa Frente Unida contra Milei. Uma Frente Única não só com as organizações de esquerda, mas com movimentos sociais como os movimentos de mulheres, jovens, indígenas. Impedir que Milei implemente a sua agenda, lutando contra os ultraliberais (e neoliberais), é a tarefa do momento para a esquerda na Argentina. E, quando estas lutas e convulsões vierem, estarem preparados para mostrar aos trabalhadores e à população argentina que a extrema-direita não resolverá os seus problemas e que o verdadeiro caminho anti-establishment é em direção a esquerda radical, socialista e revolucionária.

Por Miguel Mendez (Chicago, EUA)

Publicado originalmente por Internationalist Standpoint

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